Luanda - A criação de uma
Entidade Reguladora da Comunicação Social em Angola (ERCA) está a preocupar os jornalistas
angolanos. A medida foi aprovada em Conselho de Ministros, no final de junho, e
a nova entidade surge para substituir o antigo Conselho Nacional de Comunicação
Social.
Fonte: Lusa
A ERCA terá como
função garantir a objetividade e a isenção na informação, salvaguardar a
liberdade de expressão e assegurar que a atividade dos media angolanos está em
consonância com a Constituição. Mas o que está a deixar os jornalistas
preocupados é a composição do órgão. Informação avançada pela agência Lusa no início
deste mês revelava que o Conselho Geral da ERCA será constituído por 11
elementos. Cinco nomeados pelo partido com a maioria dos assentos parlamentares
(o MPLA), dois pelos restantes partidos, dois membros do Governo e dois
jornalistas indicados por organizações representativos da profissão.
A reação do MISA-Angola (Instituto de Comunicação Social da África Austral
– Angola), que luta pela liberdade de expressão em África, chegou rapidamente
pela voz do seu presidente, Alexandre Solombe. “Está-se logo a ver à partida
que o partido que tiver a maioria no parlamento vai continuar a dominar o nível
deste órgão”, lamentou o responsável, avisando que a entidade tem de ser
“independente até na sua composição”. Em declarações à Lusa, Alexandre Solombe
advertiu que a entidade reguladora não pode ser “politicamente alinhada com o
regime”.
As críticas mais ferozes têm vindo do Maka Angola, o site criado pelo
jornalista Rafael Marques para denunciar a corrupção no país. Num texto
publicado na plataforma, o analista jurídico e professor de direito Rui Verde
assegura: “Os jornalistas vão passar a ser escolhidos pelo MPLA”. O analista
apelida até a ERCA de “Polícia da Comunicação Social”. O organismo, além das
funções de regulador, terá ainda a função de atribuir as carteiras
profissionais aos jornalistas. O título que permite a um jornalista exercer a
profissão será retirado “sempre que o portador deixe de reunir as condições
exigidas por lei para a sua aquisição”, o que é, para Rui Verde, “uma
formulação devidamente genérica para deixar ampla margem de discricionariedade
à ERCA”. O analisa vai mais longe: “Obviamente que a liberdade jornalística em
Angola termina com esta lei”.
Rui Verde explica, noutro texto no Maka Angola, que “uma entidade que
assume poderes de supervisão é uma entidade que fica dotada de poderes
administrativos de intervenção direta, designadamente como instância de recurso
e com capacidades revogatórias”. O grande problema, sublinha o jurista, é que
os textos das leis incluem “cláusulas gerais e indeterminadas”, que “remetem as
decisões para os aplicadores”.
A nova legislação é
particularmente feroz para os meios de comunicação online. José Eduardo dos
Santos tinha, no ano passado, assumido que “o país devia adotar assim que
possível legislação adequada” para regular as práticas inaceitáveis nas redes
sociais, como “transmitir conteúdos degradantes ou moralmente ofensivos”, como
lembra o Daily Mail. Estas declarações foram feitas na altura em que os 17
ativistas angolanos, entre os quais Luaty Beirão, foram presos e as redes
sociais se inundavam de mensagens de apoio. Muitos apoiantes dos ativistas
tiveram inclusivamente de acompanhar o julgamento através de meios online,
devido à falta de cobertura feita pelos meios de comunicação angolanos.
O jornalista Rafael Marques, um dos principais críticos do regime angolano,
que já chegou a estar preso por causa de artigos que escreveu, diz que o MPLA
quer “controlar e censurar qualquer tentativa de ativistas políticos usarem as
redes sociais e a internet para alertar para os exemplos mais escandalosos de
corrupção, nepotismo e abuso de poder”, citado pelo jornal britânico The
Guardian.
José Eduardo dos Santos, à frente de Angola desde 1979, conseguiu aprovar o
pacote de medidas, que inclui propostas para a Lei de Imprensa, Estatuto do
Jornalista, Exercício da Atividade de Radiodifusão, Exercício da Atividade de
Televisão e, finalmente, a criação da ERCA, pouco antes do congresso do MPLA.
A ERCA deverá substituir definitivamente o Conselho Nacional de Comunicação
Social até ao final deste ano, após ser apreciada pela Assembleia Nacional.
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